Sonho e mito: um estudo sobre a psicologia dos povos, escrita por um dos pioneiros da psicanálise, livro inédito por 111 anos em língua portuguesa, faz agora parte da Série Escrita Psicanalítica para que nos ajude a seguir repensando a forma de escrever em psicanálise. 
A edição em questão é traduzida por Lucas Krüger, Eduardo Spieler e Sander Machado da Silva a partir do alemão. 
 
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Há mil motivos para os psicanalistas conhecerem o ensaio de Karl Abraham, originalmente publicado em 1909. Podemos citar, sem maiores explicações, apenas alguns. Para maiores esclarecimentos, no livro há extensa nota introdutória e várias outras como nota de rodapé.

1- Neste livro, Abraham cunha o termo “recalcamento em massa”. E faz diversos apontamentos e reflexões acerca da civilização, que adiantam temáticas que Freud trabalha posteriormente.
2-Abraham não usa o termo “Sexualtrieb”, mas sim “ Geschlechtstrieb” ao se referir a pulsão sexual. Este termo não era do agrado de Freud, por ser usado pelos sexólogos da época. É curioso o fato de Freud não ter advertido Abraham quanto a isto. 
3- Há uma passagem em que Abraham descreve uma oposição entre uma força energética que serve à vida (elucidando algo bem próximo do que entendemos por Eros) e outra que serve à morte (neste caso, refere-se dentre outras coisas, ao suicídio). Estamos em um ensaio escrito 11 anos antes de Freud cunhar o conceito de pulsão de morte, em uma passagem interessantíssima.
4-Abraham relaciona os conhecimentos e mitos de diversas culturas e mitologias, onde poderiam destacar, por exemplo, a indiana, mas dedica-se incansavelmente ao tema do fogo e a Prometeu. Freud escreve ensaio acerca do fogo e Prometeu apenas em 1932, de maneira muito mais breve do que Abraham (e sem citá-lo).
6-Ele trabalha correlações interessantíssimas entre o modelo do sonho e o modelo do mito, e mergulha no campo dos processos representacionais e suas modalidades de “roupagem simbólica”.
7-No livro há um uso ainda indiscriminado do termo transferência (Übertragung).
8-E muitas outras particularidades e contribuições, mas seria difícil seguir a enumerar sem maiores contextualizações.
 
SUMÁRIO
I. Objetos e perspectivas das investigações psicanalíticas
II. Fantasias infantis em sonhos e mitos — transferência da teoria do desejo para o mito
III. O simbolismo na linguagem, no sonho, assim como na estrutura de outras fantasias
IV. Análise da saga de Prometeu
V. O infantil na psicologia individual e na psicologia dos povos — A realização de desejos no sonho e no mito
VI. O efeito da censura no sonho e no mito — o trabalho da condensação
VII. Deslocamento e elaboração secundária no sonho e no mito
VIII. O efeito do trabalho do deslocamento nas sagas de Prometeu, Moisés e Sansão
IX. Os meios de figuração do mito
X. A realização do desejo na saga de Prometeu
XI. Análise da origem do mito da bebida divina
XII. A teoria do desejo no mito
XIII. As forças determinantes na vida psíquica individual e coletiva